26 de ago. de 2008

Sopro

O ar, embora muita gente nem se atine, é ingrediente fundamental para uma série de preparos culinários, que vão desde aqueles pratos mais sofisticados até ícones da chamada “baixa gastronomia”. O mais célebre exemplo de comida com ar é o popularíssimo pastel. Não é a toa que pastel mal recheado é conhecido justamente como “pastel de ar”. Porém mesmo naqueles pastéis repletos de carne, queijo, palmito, bacalhau ou outros ingredientes o ar é importante para que ele tome sua forma no momento da fritura, acomodando como se deve o recheio.

Célebres também pelo ar que contém são o barulhento biscoito de polvilho e o suflê. O primeiro é simplesmente amado pela criançada e é quase impossível comer um só quando o pacote é aberto. Em formato de argola, curto como um polegar ou em bolinha, o biscoito de polvilho é muito comum em rodoviárias e nos postos de beira de estrada, perfeitos para ludibriar aquela fominha dos viajantes. Já o suflê é considerado chique e não muito fácil de preparar. A palavra vem do termo francês souffer, que significa justamente respirar. É um prato fofo à base de molho branco ou bechamel, gemas, claras em neve e mais o ingrediente de sabor específico de cada receita. Levado ao formo em fôrma refratária alta para assar, deve ser servido imediatamente para não murchar (ficando, aí, desenxabido, de aparência feia).

Aliás, isso de comida murchar é um dos pesadelos da dona-de-casa na cozinha, e com certeza todas já passaram ao menos uma vez na vida pela desagradável situação de ver aquele belo bolo que estava sendo assado tornar-se de repente uma massaroca embatumada porque a porta do forno foi aberta indevidamente em hora errada e o ar frio interferiu no processo.

Na fermentação de pães e bolos, o ar é injetado nesses alimentos possibilitando sua maciez e altura; ao transformar clara de ovo em neve, também é o processo de aeração em ação, o que ocorre idem quando se faz chantilly com creme de leite fresco. É o ar dentro da clara em neve que formata o suspiro ao ser assado, da mesma maneira que possibilita espaço em bombas, profiteroles e vol-au-vent para que sejam recheados posteriormente.

A cozinha contemporânea é pródiga na utilização do ar para seus preparos, que o diga o chef catalão Ferran Adrià com suas surpreendentes espumas feitas em sifão a partir de gelatina e ingredientes exóticos como água do mar (!), essa especificamente utilizada para guarnecer e harmonizar pratos com peixes e frutos-do-mar. Um sopro criativo na gastronomia, certamente, se bem que nem todos consideram as criações de Adrià como comida de verdade.


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