2 de mai. de 2008

Duas crônicas, para começar

“... QUEM COMER FICA LOUCO!”

Numa época em que a variedade de guloseimas açucaradas não era tão ampla como a existente hoje nas gôndolas dos supermercados, em prateleiras de padarias e balcões das sorveterias self-service, havia um doce que causava sensação entre a criançada dos idos de 70 e 80 em minha cidade, Penápolis, interior de São Paulo: o melequento “machadinho-de-coco”, delícia grudenta vendida pelas ruas por um velho senhor com seu tabuleiro.Em forma de puxa-puxa o doce nada mais era, descobri bem depois, do que a bala de coco (esta das festas de aniversário de criança) ainda não solidificada, que o vendedor munido de um pequeno machado – na verdade, mais um tipo de enxadinha – cortava aos bocados e servia à ávida petizada num retalho de papel pardo.Extremamente macio, o doce esticava quando mordido e, não raro, era preciso usar os dedos para separá-lo entre o papel e a mordida. Grudava nos dentes e no céu da boca antes de seguir seu viscoso trajeto goela abaixo...E a molecada, sempre perversamente criativa, emendava ao refrão do vendedor ao anunciar sua mercadoria (depois que ele seguia em frente, claro): “Olha o machadinho-de-coco!”. E as crianças: “... quem comer fica louco!”, sob o olhar enfezado do velho que segundo diziam na época, virava lobisomem (!)

FUUUUUÓÓÓÓÓ!

Fígado, bucho, coração, rins, bofe para os cachorros..., enfim vários dos órgãos que habitualmente recheiam bois e porcos estavam à disposição dos consumidores nos carrinhos brancos dos bucheiros que, puxados por cavalos, circulavam pelas ruas das cidades do interior até meados dos anos 90.Preocupações com higiene à parte, muitas donas-de-casa compravam dos bucheiros os pertences para preparar a mistura do almoço ou da janta. Também havia língua (inteira, enorme, com aquela espécie de “lixa” preta) de boi ou vaca, rabo para a rabada, mocotó, cérebro (ou miolo) para fazer bolinho ou à milanesa – dizem que é bem saudável, principalmente para as crianças, porém duvido que alguma delas comeria hoje conscientemente... – e, às vezes, lingüiça fresca e um chouriço roliço e escuro, feito com sangue coagulado e muitos condimentos.Todos esses miúdos eram obtidos pelos bucheiros direto nos matadouros e eles anunciavam sua chegada tocando vigorosamente em uma corneta: Fuuuuuóóóóó! Era tudo bem mais barato que nos açougues, porém a profissão acabou quando foram endurecidas as normas sanitárias e as pessoas tornaram-se mais encanadas com as questões de saúde.

1 comentários:

Unknown disse...

Entre os aromas das ervas finas e o fino do prato... Sem comentários.
A única coisa é que irei proibir-me de visitar seu blog sempre que estiver com fome. UAU! Essas delícias são de enlouquecer... São de cometer o pecado da gula somente com os olhos. Não quero nem imaginar pessoalmente.
Parabén Big Chef. Você é UM SAGITARIANO PORRETA MESMO. O máximo.
Beijos saudosos da londrinense.
Juju